sexta-feira, 19 de abril de 2019

Criativo vs Mecânico

    Tenho evidenciado prioritariamente uma crença no treino de futebol pela mecanização de gestos técnicos isolados, pela dependência de treinos perfeitamente organizados, com exercícios espalhados pelo espaço do terreno de jogo. A degradação dos aspectos criativos ocorre quando os exercícios utilizados tornam-se radicalmente irreais ao contexto do futebol e sem referência ao jogo pretendido.

A mudança de "face" do futebol esta bloqueando o aparecimento de jogadores criativos, capazes de solucionar os problemas no jogo através de respostas originais, eficazes e imprevisíveis, porque as acções rotineiras treinadas são pouco inovadoras e facilmente bloqueadas pelos adversários.


O futebol implica que o treino seja criativo, de forma a modelar o contexto a partir de acções controláveis, imprevisíveis e alteráveis, já que a resolução das situações competitivas não será sempre única, e os atletas precisam de criatividade & inteligência para ultrapassa-las.

A falta de qualidade criativa e de inteligência nos jogadores tem a ver com os estímulos onde os jovens aprendem a jogar futebol. Quando tinha a idade do Henrique, a escola mais popular para descobrir os segredos do futebol era a rua, onde as carências eram supridas com imaginação, ilusão e "chico espertismo"; actualmente essa tendência é cada vez menor ou nula e as escolas de futebol nos clubes não conhecem a importância da criação de contextos criativos e passaram a formar atletas "mecânicos" ao invés de jogadores de futebol.

Nesse entendimento, a criação do contextos criativos entra em campo com o objectivo de formar jogadores e equipas criativas e com capacidade de resolver problemas, buscar novos desafios, conhecimentos e a diversidade que o futebol necessita. E o contexto só será criativo com o jogo, que incita os jogadores a pensar, aprender, descobrir, antecipar, reconhecer padrões, estimular as emoções e criar caminhos para a transformação. Como é necessário, os jogos devem ser estruturados visando a resolução de determinados problemas pertencentes à forma de jogar que a equipa aspira. Utilizando o jogo constantemente como veículo de treino-competição, a capacidade de estabelecer relações pré-estabelecidas e inusitadas para resolver problemas, além de identificar diversas alternativas para tais resoluções, se bem estruturados, constantemente oferecerão margem ao pensamento criativo.


Neste contexto, o Henrique Alves, tem vindo a revelar uma certa apatia e desconforto pela repetitividade dos treinos que semanalmente são organizados pelo clube, que seguem uma linha orientadora visando atingir no final da época os objectivos propostos. Sem querer ferir susceptibilidades, não me revejo no actual modelo de treinos que são transversais a quase todas as equipas de futebol na actualidade.

No percurso que realizamos durante a semana até as instalações do Sintrense, explico ao Henrique como eram organizados os treinos no Atlético de Madrid, onde a vertente da preparação física era predominante nos primeiros 30 minutos de cada treino. A equipa era entregue ao preparador físico, este elaborava os exercícios que a equipa técnica tinha acordado para atingir os objectivos  pretendidos, depois éramos "libertados" para os treinadores organizarem o treino-jogo extremamente competitivo e com grande intensidade entre todos os jogadores do plantel, onde éramos interrompidos quando necessário para corrigir erros ou realizar alguns movimentos específicos que o Mister tinham em mente.

Durante o jogo-treino podíamos "criar" jogadas individuais ou colectivas, tínhamos a liberdade de sair a jogar desde a nossa defesa, com toque de bola com finta ou com lançamento longo. Nos ensinavam que não havia problema na perca da bola, mas sim a falta de atitude na recuperação da mesma, a bola era "nossa" e não do adversário, a partir de aí estabelecia-se um equilíbrio não escrito entre os objectivos da equipa técnica e a liberdade criativa do grupo de trabalho. Na fase final do treino eram realizados trabalhos específicos por grupos, consoantes as posições de jogo de cada atleta.




Ser criativo é uma condição permanente que dura toda a vida e criar no futebol é fabricar intencionalmente uma forma de jogar com inovações que sejam eficazes e eficientes, o que consequentemente afectará a capacidade criativa dos jogadores e da equipa.

Infelizmente, a palavra "organização" entendida no futebol de hoje prima pela rigidez e mecanicidade das acções e pela "robotização" dos jogadores. Ela reduz esta individualidade, impedindo a emergência do "eu" individual e, por tanto do "eu" colectivo criador. Qualquer noção de organização que procure diminuir ou eliminar o imprevisível e a criatividade, acentuando a mecanização das acções de jogo, limita a individualidade e a colectividade da equipa, levando esta inevitavelmente ao fracasso, que no futebol é a derrota.


domingo, 17 de fevereiro de 2019

Esforço e dor vs Êxito

O esforço e a dor são precisos para o êxito, nós pais devemos deixar que os nossos filhos aprendam a superarem-se nas suas próprias dificuldades, os obstáculos, podem parecer insuperáveis e muito dolorosos. É exactamente isso que as nossas crianças precisam, para que cada dia sejam mais fortes.

Na natureza o ato de dar a vida é muito doloroso e difícil. A maioria dos pais, cometem o erro de tentar ajudar os seus filhos a ultrapassar as dificuldades, retirando do caminho as pedras por eles. Ao fazerem isso, não são conscientes do mal que lhes fazem, pois anulam as suas capacidades como seres humanos, limitando-os de tal maneira, que se tornam crianças incapazes de gerir desafios e decisões, porque a palavra esforço para elas não existe. Desconhecem por completo, e nós pais com o pretexto de não querer que os nossos filhos passem pelas mesmas dificuldades que nós passamos, estamos a criar uma geração de pessoas dependentes, inseguras e pouco ou nada produtivas.

O nosso papel é preparar os nossos filhos, no processo de aprendizagem pela vida, dar-lhes conselhos baseados na nossa experiência e vivências adquiridas, por termos passado pelas mesmas dificuldades, porque, isso é a vida.

Os pequenotes têm de aprenderem a resolver os seus próprios problemas e saberem identificar qual são os factores que os provocam, e serem capazes de resolve-los e encontrarem a maneira de continuarem em frente. Estes processos confronta-os com situações que não conseguem evitar, devem aprender, crescer e transformarem-se, e a maioria das vezes o tem de fazerem sozinhos, porque essa evolução, só dependem de eles e de mais ninguém.

O esforço é imprescindível para aprender e lograr o êxito, é o factor determinante para atingirem os seus objectivos, pois impulsionam e sustenta-os na acção, também os ajuda a valorar as coisas, pois o que se consegue com esforço, tem um sabor e um valor especial. É um ingrediente fundamental para o êxito, que esta ao alcance de todos.

No dia 10 de Fevereiro de 2010, ou seja oito meses e dois dias do Henrique Alves ter nascido, o pirralho, chega-me a cozinha a gatinhar a alta velocidade, sentando-se a seguir e observando o que estava a fazer, reparou que o biberão da água estava em cima da cadeira, a poucos metros de onde ele se encontrava. Começou a pedir-me que lhe desse água, virei-me e pus-me de cócoras, olhei para o biberão e diz-lhe com ar sério “queres água, levanta o cu do chão e vai tu busca-la.” A reacção do Henrique deixou-me perplexo e encheu-me de alegria, ao ver o bebé, primeiro com uma cara de espanto, na altura pensei iria chorar, e a seguir pondo as mãos no chão, tentava levantar-se de uma maneira desajeitada e algo trapalhona e começou a cambalear-se em direcção a cadeira.

A minha primeira reacção foi a de protege-lo da mais provável e eminente queda, mas ouve em mi uma curiosidade em saber se o desafio que coloquei, este o superaria ou não. Passados poucos segundos, o meu coração se inundou de uma imensa alegria e orgulho ao ver a cara do meu filho bebendo água com uma satisfação como nunca tinha visto.

Com o narrado nestes parágrafos, quero ajudar a todos os pais que por vezes, tem atitudes menos adequadas na formação dos seus educandos, sem terem a noção que estão a deixar sem “defesas” as pessoas mais importantes das suas vidas.


terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

Next Level

Como referi no artigo de opinião anterior, o Henrique Alves (com oito anos) tinha sido referenciado por vários clubes do distrito de Lisboa e inclusive tinha começado a frequentar o Centro de Formação do Grupo Desportivo Estoril Praia.

“A minha amiga” como o Henrique acostuma referir-se à bola, foi sempre uma fiel companheira de viagem, sempre com a bola nos pés e na cabeça, fosse no jardim, no alpendre, no quarto, pela sala ou nas refeições debaixo da mesa da cozinha.

O Henrique Alves sempre muito apegado à família, sobretudo à mãe Carla, "Só pensas em futebol", diziam-lhe ela e os amigos, aos quais sempre respondia, “É o que eu gosto”.

Na presente temporada (2018/2019) e já feitos os nove anos, em jogo de preparação entre as equipas do SCUT Torreense vs Sport União Sintrense, o miúdo “magricelas” e “franzino” deu nas vistas.

E de tanto gostar que a relação foi ficando séria, a tal ponto que o caminho que foi sendo trilhado o levou até a Vila de Sintra, património da Humanidade.


Numa altura em que os pais do pequeno Henrique tinham de fazer qualquer coisa como quinhentos quilómetros por semana, entre Torres Vedras e Sintra, para que o miúdo pudesse treinar e jogar numa equipa que lhe proporcionou umas condições adequadas para que o caminho que escolheu não se visse afectado pela distância ao centro metropolitano da capital do pais.

O “franzino” foi surpreendendo tudo e todos, enquanto a Academia do Sintrense nas pessoas dos treinadores João Luís, João Correia, Gonçalo e Rafael o ajudavam a potenciar o talento que, em boa verdade, cedo lhe anteciparam.

Nem sempre fácil, nem sempre simples, a estrada que escolhemos percorrer nunca é uma “via rápida”. A opção de mudar de clube implicou uma “logística” familiar muito bem sincronizada. Onde a avó paterna ficou encarregue de deslocar o “magricelas” da escola até ao local de trabalho do pai, que fica a meio caminho de Sintra.


“Ao fim de seis meses, fazia aquela viagem tantas vezes que tinha todas as voltas, cruzamentos e semáforos memorizados”, dizia o puto.

"Te farei entender e te ensinarei o caminho que tens de percorrer; sob ti fixarei o meu olhar" Salmos 32:8